Pedro, O Grande

Faça-se um giro pela cena internacional cotejando os desenvolvimentos em curso com o pensamento estratégico de Pedro “O Grande”:

Aproximem-se o mais possível de Constantinopla e da Índia. Quem quer que governe aí será o verdadeiro soberano do Mundo. Por este motivo, provoquem guerras contínuas, não só na Turquia, mas também na Pérsia. Penetrem até ao Golfo Pérsico, avancem até à Índia.”

MC

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Jaafar, “o Decepado”, na batalha de Muta

Há episódios que parecem saltar de um tempo e lugar para outro ao longo da História. Karen Armstrong, especialista em História das Religiões, refere, por exemplo, uma das epifanias de Jacob, que sonhou com uma escada entre o céu e a Terra, com os anjos a ir e vir entre os reinos de Deus e do Homem – remetendo-nos para o zigurate de Marduk. Mas há mais casos idênticos, como o seguinte.

Aprendemos nos bancos da escola a história de Duarte de Almeida, Alferes-mor de D. Afonso V e herói da batalha de Toro, conhecido como “o Decepado”. Em 1 de Março de 1476, na qualidade de porta-estandarte real, defendeu-o com valentia, mesmo depois de lhe terem cortado as mãos, segurando-o com os braços e com os dentes até ser aprisionado pelas tropas castelhanas.

Edward Gibbon, historiador inglês, falecido em 1794, narra um episódio surpreendente e idêntico:

“Quando regressou vitorioso da guerra da Pérsia, Heraclio recebeu em Émeso um dos embaixadores de Maomé, que convidava os príncipes e as nações da terra a professar o islamismo. O zelo dos árabes viu neste evento a prova da conversão secreta do imperador cristão; a vaidade dos Gregos forjou por seu turno uma visita pessoal do príncipe de Medina, que teria aceite da régia magnanimidade um rico domínio e um retiro seguro na província da Síria. No entanto, a amizade de Heraclio e Maomé teve curta duração; a nova religião inflamara mais do que abrandara o espírito de rapina dos Sarracenos; e o assassínio de um enviado forneceu um pretexto decente para a invasão, com três mil soldados, do território da Palestina que se estende a leste do Jordão. A bandeira santa foi confiada a Zeid (antigo escravo de Maomé); e a disciplina e o fanatismo da seita nascente eram de tal ordem, que os mais novos chefes serviram de bom grado sob o escravo do profeta. Se ele porventura morresse, devia ser sucessivamente substituído no comando por Jaafar e Abdalá; e, caso perecessem os três na guerra, as tropas estavam autorizadas a eleger o seu general. Os três chefes sucumbiram na batalha de Muta, a primeira acção militar que pôs à prova o valor dos muçulmanos contra um inimigo estrangeiro. Zeid tombou como soldado na primeira fila; a morte de Jaafar surge-nos heróica e memorável; tendo perdido a mão direita, mudou o estandarte para a esquerda; a esquerda foi-lhe também cortada; cingiu então o estandarte com os seus dois cotos sangrentos, até baquear trespassado por cinquenta honrosas feridas. «Avançai», gritou Abdalá, que logo ocupou o lugar vago, «avançai confiantes, a vitória ou o paraíso serão nossos.» A lança de um romano decidiu a alternativa.(…)”

E. Gibbon, “Declínio e Queda do Império Romano“, vol. II.

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Flávio Heráclio Augusto (575-641), conhecido como Heráclio, o Jovem, reinou como imperador bizantino de 610 a 641. No final do seu reinado as províncias da Síria, Judeia e Egipto foram perdidas para os árabes, unificados por Maomé.

Na Wikipedia:

“Ja’far fought until both his arms were cut off, (…) but he was eventually killed. A Roman struck him and cut him in two halves. One half fell on the grape vine, and roughly thirty wounds were found on it. The body of Ja’far held seventy-two scars between his shoulders, where he had been either struck by a sword or pierced by a spear.”

https://en.wikipedia.org/wiki/Ja%27faribnAbiTalib

https://en.wikipedia.org/wiki/BattleofMu%27tah?fbclid=IwAR2YmjhMrgndub2gxfmH-4p4p9ILbmc8TSkTO0HUhxu3lj0Xr1XXGYySg

MC

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Carne de porco

Sobre o porco, animal impuro no antigo Egipto. Impuro também para os judeus, como se consigna no Antigo Testamento e, mais tarde, para os muçulmanos.

Para António de Macedo (em Cristianismo Iniciático), “factores ambientais, mais do que culturais, são responsáveis por se ter imposto a interdição da carne do porco enquanto alimento. Se os gados bovino, caprino e ovino consomem erva, os porcos num ambiente deserto são fracos animais de pasto e concorrem com os humanos pelos cereais. Por outro lado, os porcos não produzem nenhuma utilidade, para além de fornecer carne, comparados com os bovinos e os caprinos que fornecem leite, transporte e trabalho. Isto fez com que os porcos fossem infamados.”

Marvin Harris, em Canibais e Reis (citado por Macedo): “As culturas tendem a impor sanções sobrenaturais ao consumo de carne animal quando a percentagem de benefícios comunitários para os custos associados ao uso de uma espécie particular se deteriora. Espécies baratas e abundantes, cuja carne pode ser comida sem perigo para o resto do sistema através do qual a comida é obtida, raramente se tornam alvo de proscrições sobrenaturais. Os animais que têm altos benefícios e baixos custos numa altura, mas que depois se tornam mais dispendiosos, são os principais alvos de sanções sobrenaturais. As restrições mais severas tendem a desenvolver-se quando uma espécie nutritivamente valiosa não só se torna mais dispendiosa como a sua utilização continuada ameaça o modo de subsistência existente. O porco é uma dessas espécies.”

MC

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A culpa não é minha!

José Brissos-Lino, Visão, 27 Fev 2019

O tema da culpa está muito presente nas religiões desde sempre, em especial no cristianismo. O sentimento de culpa é tão forte e desagradável que as pessoas logo desde a infância procuram remeter a culpa para os outros, de forma instintiva, sacudindo a água do capote.

Jean Bottéro, antigo padre dominicano que estudou profundamente a Mesopotâmia, investigou os mecanismos do pecado e da culpa. Nas religiões primitivas parece que os seres humanos andariam apavorados face aos fenómenos atmosféricos que não compreendiam nem controlavam, com medo dos perigos e do desconhecido, lutando diariamente pela sobrevivência, mas não sabiam o que era o peso da culpa. Até que, há cerca de quatro ou cinco mil anos, começou a ser introduzido no imaginário colectivo o sentimento de culpa. Se o indivíduo perdia a colheita, se lhe morresse um filho ou se o seu animal de carga adoecia tal não seria devido às vicissitudes da vida, à má fortuna ou aos caprichos dos deuses, mas porque tinha feito qualquer coisa errada para merecer tal punição. Acabara de surgir a ideia de pecado.

Inicialmente o conceito de pecado não se referia a uma transgressão do pecador na sua vida de cada dia, nem tinha uma carga moral. Resultava apenas de algum erro inconsciente na invocação dos deuses. O indivíduo associava então a violência dos elementos e a adversidade a algum erro eventualmente cometido na liturgia do animal previamente sacrificado. Era um pecado inconsciente, mas o adorador interiorizava uma culpa própria. Essa invenção mesopotâmica resultou na transferência de culpa dos poderes divinos para os homens. Martín Caparrós diz que os indivíduos descobriram então que estavam enganados “eram eles que causavam as desgraças e deviam saber como e porquê. Os deuses eram como aqueles pais que batem no filho enquanto dizem que ele já sabe porquê.”

Sendo assim, o cristianismo deu um passo em frente ao propor um código de conduta associado à ideia de pecado. Daí resultou autonomia pessoal, já que agora os indivíduos poderiam decidir se queriam ou não quebrar as regras, como e quando. A culpa continuava a ser própria mas o castigo passava a fazer sentido e a ser associado a uma causa perceptível à consciência. Todo o mal resultava sempre dos pecados dos homens pois Deus era infinitamente justo. Foi o que aconteceu na justificação do terramoto de Lisboa em 1755, uma catástrofe que chocou o mundo, quando o coração do Império Português ficou reduzido à insignificância. O padre Malagrida convocou o povo e a corte ao arrependimento, tomando a catástrofe como resultado da ira divina contra a corrupção da sociedade.

Porém, agora nem da culpa somos donos. As religiões perderam o seu principal instrumento de controlo e o indivíduo passou a atribuir a sua culpa aos grupos, ao sistema, à sociedade, aos políticos, aos economistas, aos ricos, aos imigrantes, aos “infiéis”. O diabo são os outros, a culpa nunca encontra com quem casar e acaba por morrer solteira.

Depois ainda há o caso de alguns grupos neopentecostais que infantilizam a pessoa atribuindo a culpa de todos os males à possessão demoníaca. É simples. Se o pai é alcoólico é porque está oprimido pelo “demónio do álcool”, se o marido agride a mulher é porque está possuído pelo “demónio da violência” e tem que ir a uma reunião de culto na igreja para o pastor fazer uma oração a fim de expulsar tais entidades. Infantilização e controlo.

Paul Tournier entende que a culpabilidade está ligada à relação com os outros, às críticas alheias, ao desprezo social e ao sentimento de inferioridade, sem esquecer as questões religiosas que suscita. O psiquiatra estabelece um elo entre remorso, constrangimento, consciência pesada, vergonha, timidez e até modéstia, partindo do princípio de que o sentimento de culpa é inerente ao ser humano, como um alerta de que alguma coisa foi feita de forma errada e contrapõe a graça de Deus como uma resposta: “a consciência culpada é a constante da nossa vida. Toda a educação, em si mesma, constitui um cultivo intensivo do sentimento de culpa, mesmo a melhor educação que se recebe de pais preocupados.”

Passámos assim duma culpa difusa a uma culpa com sentido e depois a uma inocência a toda a prova, fazendo coro com o mito do “bom selvagem” de Rosseau. As pessoas são boas, a sociedade é que não presta. Como se a sociedade não fôssemos todos nós. Sabemos que a melhor maneira de retirar conteúdo a uma palavra ou conceito é vulgarizá-lo. A banalização da culpa por via de religiões castradores e inquisitivas desembocou num humanismo sem alma, artificial e infantil, onde ninguém é responsável por coisa nenhuma.

A resistência em assumir a responsabilidade ou mesmo a culpa pelos erros cometidos retira aos indivíduos a oportunidade do perdão (pedir e receber), essa função social e espiritual altamente libertadora, e impede uma correcção dos procedimentos no futuro. Pois é. Só os burros é que não mudam. E mesmo assim tenho dúvidas.

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Doutorado em Psicologia e Especialista em Ciência das Religiões; Diretor do Mestrado em Ciência das Religiões na Universidade Lusófona; Coordenador do Instituto de Cristianismo Contemporâneo; Investigador do CLEPUL (Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e Europeias – Universidade de Lisboa) e do CIPES (Centro de Investigação em Política, Economia e Sociedade-Universidade Lusófona). Desenvolve há muitos anos intensa atividade em instituições culturais, humanitárias e de solidariedade social, algumas das quais fundou.

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As complexas escolhas no “procurement” aeromilitar

Na nossa santa terrinha.

“O presidente francês Macron defendeu recentemente um maior protagonismo militar europeu traduzido, entre outras formas, numa maior orientação para a selecção e aquisição de material militar concebido e produzido na Europa, em detrimento daquele de outros fornecedores, nomeadamente americanos. É este o ponto de partida para o presente artigo, que marca a chegada ao Operacional de um novo colaborador, nesta interessante área cujas implicações vão muito para além da tecnologia.”

Miguel Silva Machado

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Católicos anticlericais precisam-se

António Pimenta de Brito

Observador, 22/2/2019

Tristemente e depois de vários países com centenas, milhares de casos e figuras altas da Igreja acusadas e condenadas, os negacionistas ainda existem. Sejam eles noutros países, mas no nosso também.

Nunca pensei algum dia, como crente católico, poder vir a dizer que sou anticlerical. Sempre me ensinaram na minha fé que, pela história, os maus da fita eram os anticlericais. Desde os “jacobinos” aos “mata-frades”, estes eram os “anticlericais”. Desde a repressão dos religiosos do tempo da revolução francesa, do Marquês de Pombal e da extinção das ordens religiosas, ao tempo da República. Em parte, eram de facto os maus da fita, pois reprimiram o clero de forma violenta, intolerante e injusta, resta saber se existiam razões legítimas para a animosidade. Não sei, não investiguei. Sei que Lutero tinha algumas razões para a rutura que fez, mesmo que como católico não concorde com a forma como lidou com a decadência do clero. A Igreja é como a família. Amamo-la e por isso nos chateamos mais quando nos desgosta, mas não a abandonamos. No que pudermos, tentamos mudá-la de dentro, começando por nós mesmos.

Hoje em dia o termo ganhou outro significado com o Papa Francisco, o qual diz que o “clericalismo é um cancro”. Sei que muito antes, vinha já do Concílio Vaticano II esta urgência da Igreja ir ao encontro do mundo, dar outro papel aos leigos e não ficar na sua autorreferencialidade. Passados mais de 50 anos sobre Concílio, o Papa Francisco faz o diagnóstico: há ainda um grande caminho por trilhar para erradicar esta doença.

O que é o clericalismo? É a concentração do clero no seu poder e não no serviço aos outros. Este comportamento vem de clérigos como de leigos. Como diz o Papa, devemos trocar isto pela “cultura do encontro” e pelo “testemunho”. Este fenómeno nunca esteve tão patente na crise dos abusos sexuais, em que a causa é o próprio clericalismo, segundo o Papa. Tristemente e depois de vários países com centenas, milhares de casos e figuras altas da Igreja acusadas e condenadas, os negacionistas ainda existem. Sejam eles noutros países, mas no nosso também. A recente investigação dos abusos em Portugal, pelo Observador, até bastante equilibrada, diga-se, também levou com as críticas dos habituais negacionistas. “Não é bem assim”, “os outros também fazem”. Há ainda os tradicionalistas que referem que o problema é a homossexualidade dentro da Igreja. Pergunto aos mesmos, há dados concretos – provas – dessa afirmação? Uma coisa é falar por alto, outra concretizar com números. Não vi e posso não estar informado, mas não creio que: 1) a maioria dos padres seja homossexual; 2) que os que sejam, sejam pedófilos. Há uma diferença entre ser homossexual e pedófilo e, segundo um dos porta vozes das vítimas, a maioria das mesmas são mulheres. Além disso, basta pensarmos em algo simples: a maioria das pessoas são heterossexuais, sendo uma minoria homossexual. Isso não é diferente no clero, com certeza. As pessoas esquecem-se de outro desequilíbrio sexual, a heterossexualidade também pode ser descontrolada e pouco madura.

O caso mais abstruso do negacionismo que encontrei recentemente foi agora aquando da redução ao laicado do Cardeal McCarrick. Um padre português muito ativo nas redes sociais, de nome João Vila-Chã, no Facebook afirmar que o Cardeal “não é pedófilo; está acusado de abusos, sexuais e de poder, mas não por ser pedófilo”. O Cardeal abusou de um menor, mas não é pedófilo, segundo este Padre. É esta a mensagem de um clérigo, até bastante seguido por gente muito ilustre. São estes os burocratas da religião. A seguir, até uma jornalista de um conhecido portal católico o apoiou dizendo esta preciosidade, “há que distinguir abusos, de pedofilia”.

Mais: um padre amigo, uma pessoa que até prezo como boa pessoa, disse-me que se forem abusos em contexto de família, “vai-se denunciar um familiar?”. Se vejo isto em pessoas que considero idóneas, quanto mais em outros? É por isto que estamos como estamos. Não nos enganemos, ainda não mudámos de tempo: negamos, encobrimos, menorizamos, ignoramos, o desejo desesperado de proteger e “defender” a Igreja sobrepõe-se a qualquer noção de verdade e bom senso, já para não falar de que não protege o principal: as vítimas. Esta insensibilidade é a “indiferença”, segundo o Papa Francisco, que grassa nos nossos tempos, a doença do nosso século, a qual também chegou à Igreja.

O Pe. Manuel Barbosa, secretário da Conferência Episcopal, reagiu às investigações do Observador desta forma: “foram só” (não sei quantos casos), “Os outros o que estão a fazer?”, “Vai dar ao mesmo”(ir ao encontro ou esperar pelos testemunhos dos abusos). Senhor Pe., não vai dar ao mesmo esperar pelo testemunho ou ir ao encontro. Estas pessoas estão fragilizadas, é preciso ouvir mas tomar a iniciativa, como diz o Papa Francisco. Não consta que o samaritano estivesse à espera que o que foi assaltado por ladrões se levantasse e fosse ter com ele. Não interessa estar sempre a dizer que devemos ser uma “Igreja em saída” e “ir ao encontro” e depois ficar sentado no palácio com medo de se sujar e manchar a imagem da Igreja. Ela está, sim, manchada “do sangue do cordeiro”, D’ Ele, mas também do sangue de inocentes que carregam esta cruz.

Tristemente e depois de vários países com centenas, milhares de casos e figuras altas da Igreja acusadas e condenadas, os negacionistas ainda existem. Sejam eles noutros países, mas no nosso também.

Nunca pensei algum dia, como crente católico, poder vir a dizer que sou anticlerical. Sempre me ensinaram na minha fé que, pela história, os maus da fita eram os anticlericais. Desde os “jacobinos” aos “mata-frades”, estes eram os “anticlericais”. Desde a repressão dos religiosos do tempo da revolução francesa, do Marquês de Pombal e da extinção das ordens religiosas, ao tempo da República. Em parte, eram de facto os maus da fita, pois reprimiram o clero de forma violenta, intolerante e injusta, resta saber se existiam razões legítimas para a animosidade. Não sei, não investiguei. Sei que Lutero tinha algumas razões para a rutura que fez, mesmo que como católico não concorde com a forma como lidou com a decadência do clero. A Igreja é como a família. Amamo-la e por isso nos chateamos mais quando nos desgosta, mas não a abandonamos. No que pudermos, tentamos mudá-la de dentro, começando por nós mesmos.

Hoje em dia o termo ganhou outro significado com o Papa Francisco, o qual diz que o “clericalismo é um cancro”. Sei que muito antes, vinha já do Concílio Vaticano II esta urgência da Igreja ir ao encontro do mundo, dar outro papel aos leigos e não ficar na sua autorreferencialidade. Passados mais de 50 anos sobre Concílio, o Papa Francisco faz o diagnóstico: há ainda um grande caminho por trilhar para erradicar esta doença.

O que é o clericalismo? É a concentração do clero no seu poder e não no serviço aos outros. Este comportamento vem de clérigos como de leigos. Como diz o Papa, devemos trocar isto pela “cultura do encontro” e pelo “testemunho”. Este fenómeno nunca esteve tão patente na crise dos abusos sexuais, em que a causa é o próprio clericalismo, segundo o Papa. Tristemente e depois de vários países com centenas, milhares de casos e figuras altas da Igreja acusadas e condenadas, os negacionistas ainda existem. Sejam eles noutros países, mas no nosso também. A recente investigação dos abusos em Portugal, pelo Observador, até bastante equilibrada, diga-se, também levou com as críticas dos habituais negacionistas. “Não é bem assim”, “os outros também fazem”. Há ainda os tradicionalistas que referem que o problema é a homossexualidade dentro da Igreja. Pergunto aos mesmos, há dados concretos – provas – dessa afirmação? Uma coisa é falar por alto, outra concretizar com números. Não vi e posso não estar informado, mas não creio que: 1) a maioria dos padres seja homossexual; 2) que os que sejam, sejam pedófilos. Há uma diferença entre ser homossexual e pedófilo e, segundo um dos porta vozes das vítimas, a maioria das mesmas são mulheres. Além disso, basta pensarmos em algo simples: a maioria das pessoas são heterossexuais, sendo uma minoria homossexual. Isso não é diferente no clero, com certeza. As pessoas esquecem-se de outro desequilíbrio sexual, a heterossexualidade também pode ser descontrolada e pouco madura.

O caso mais abstruso do negacionismo que encontrei recentemente foi agora aquando da redução ao laicado do Cardeal McCarrick. Um padre português muito ativo nas redes sociais, de nome João Vila-Chã, no Facebook afirmar que o Cardeal “não é pedófilo; está acusado de abusos, sexuais e de poder, mas não por ser pedófilo”. O Cardeal abusou de um menor, mas não é pedófilo, segundo este Padre. É esta a mensagem de um clérigo, até bastante seguido por gente muito ilustre. São estes os burocratas da religião. A seguir, até uma jornalista de um conhecido portal católico o apoiou dizendo esta preciosidade, “há que distinguir abusos, de pedofilia”.

Mais: um padre amigo, uma pessoa que até prezo como boa pessoa, disse-me que se forem abusos em contexto de família, “vai-se denunciar um familiar?”. Se vejo isto em pessoas que considero idóneas, quanto mais em outros? É por isto que estamos como estamos. Não nos enganemos, ainda não mudámos de tempo: negamos, encobrimos, menorizamos, ignoramos, o desejo desesperado de proteger e “defender” a Igreja sobrepõe-se a qualquer noção de verdade e bom senso, já para não falar de que não protege o principal: as vítimas. Esta insensibilidade é a “indiferença”, segundo o Papa Francisco, que grassa nos nossos tempos, a doença do nosso século, a qual também chegou à Igreja.

O Pe. Manuel Barbosa, secretário da Conferência Episcopal, reagiu às investigações do Observador desta forma: “foram só” (não sei quantos casos), “Os outros o que estão a fazer?”, “Vai dar ao mesmo” (ir ao encontro ou esperar pelos testemunhos dos abusos). Senhor Pe., não vai dar ao mesmo esperar pelo testemunho ou ir ao encontro. Estas pessoas estão fragilizadas, é preciso ouvir mas tomar a iniciativa, como diz o Papa Francisco. Não consta que o samaritano estivesse à espera que o que foi assaltado por ladrões se levantasse e fosse ter com ele. Não interessa estar sempre a dizer que devemos ser uma “Igreja em saída” e “ir ao encontro” e depois ficar sentado no palácio com medo de se sujar e manchar a imagem da Igreja. Ela está, sim, manchada “do sangue do cordeiro”, D’ Ele, mas também do sangue de inocentes que carregam esta cruz.

Gestor, co-fundador do site datescatolicos.org

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Sem surpresa, volte-face na alegada retirada das forças norte-americanas da Síria

É notícia no Washington Post de hoje.


MC

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Casa Branca negoceia venda de tecnologia nuclear à Arábia Saudita, talvez ilegalmente

No jornal Público em 21 Fev 2019

Dirigentes americanos queriam passar por cima de leis que obrigam a um forte escrutínio da exportação de recursos atómicos.

Um inquérito da Câmara dos Representantes dos Estados Unidos mostra que vários responsáveis da Administração Trump, incluindo o secretário do Departamento de Energia e o genro do Presidente, Jared Kushner, prosseguiram negociações com a Arábia Saudita para a venda de tecnologia nuclear, apesar das objecções e alertas dos advogados da Casa Branca.

Michael Flynn, que foi o primeiro conselheiro de Segurança Nacional do Presidente, foi o principal impulsionador do projecto, quando Donald Trump chegou à Casa Branca — o general na reserva tinha trabalhado sobre o tema para a empresa que defendia o plano de exportação de tecnologia nuclear para Riad, e continuou a promovê-lo nas novas funções. Os advogados da Casa Branca avisaram Flynn que poderia violar leis para travar a proliferação nuclear e criava conflitos de interesse. Apesar de Flynn ter sido despedido ao fim de duas semanas, o projecto manteve-se prioritário para a Administração Trump, segundo o relatório da Comissão de Supervisão e Reforma do Congresso.

A mais recente reunião decorreu na Casa Branca na semana passada, e nela esteve Rick Perry, secretário da Energia, e na próxima semana Jared Kushner tem uma viagem ao Médio Oriente e leva este tema na agenda, diz o The Washington Post. Uma das empresas que constroem centrais nucleares, a Westinghouse Electric, é subsidiária da Brookfield Asset Management, que salvou finan- ceiramente a família de Kushner.

O Partido Democrata, com maioria na Câmara dos Representantes, quer abrir um inquérito. “São necessárias investigações adicionais para concluir se os actos da Administração Trump tiveram em consideração o interesse de segurança nacional dos EUA ou se, pelo contrário, serviram os que pretendem beneficiar financeiramente desta potencial mudança da política externa dos EUA”, afirmam os autores do relatório.

Entre as principais preocupações está o potencial conflito de interesses de Flynn. Em causa está também a intenção de ignorar as leis que sujeitam a exportação de tecnologia nuclear a várias instâncias de supervisão.

O ministro dos Negócios Estrangeiros do Irão, Mohammad Javad Zarif, comentou as notícias sobre este relatório no Twitter: “Primeiro, um jornalista esquartejado e, agora, a venda ilícita de tecnologia nuclear à Arábia Saudita expõem a hipocrisia dos EUA.”

“Os especialistas receiam que a transferência de tecnologia nuclear sensível permita à Arábia Saudita produzir armas nucleares, contribuindo para a proliferação num Médio Oriente já instável”, diz o relatório.

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Comentário: Esta questão deve ser relacionada com a denúncia do tratado INF pelos Estados Unidos da América, que não travava apenas a corrida às armas nucleares pelos EUA e Rússia. Procurava evitar a proliferação nuclear à escala global.

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Um pouco mais próximos da guerra nuclear na Europa

Assinatura do Tratado INF por Reagan e Gorbachev

Por mais de 30 anos, o Tratado de Forças Nucleares de Alcance Intermédio (INF) foi uma das pedras angulares do sistema de segurança internacional. Esta situação terminou em 2 Fev 2019 com a decisão dos EUA de o denunciarem, decisão que se tornará irreversível se em 6 meses a Rússia não cumprir o ultimato – a destruição “verificável” do que o secretário de Estado Mike Pompeo descreveu como “mísseis que violam o INF, seus lançadores e equipamentos associados”. Donald Trump, numa declaração oficial, garantiu que os EUA “avançarão para o desenvolvimento” de “opções próprias de resposta militar” e trabalharão com membros da OTAN e outros aliados “para negar à Rússia qualquer vantagem militar emergente da sua conduta ilegal”.

A Rússia não demorou a cancelar também a participação no Tratado e, segundo Putin, não vai reatar conversações para tentar salvar o acordo, tendo publicamente dado luz verde ao desenvolvimento de um míssil hipersónico de alcance intermédio e de um modelo terrestre do míssil de cruzeiro Kalibr.

Gorbachev disse que a decisão de Trump é um erro.

A Guerra Fria está de volta.

MC

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Quererão os egípcios um presidente vitalício?

Deputados propuseram mudanças na constituição do Egipto, incluindo emendas que ampliam os poderes militares do presidente e permitem que Abdel Fattah al-Sisi permaneça no cargo após o final de seu segundo mandato, e potencialmente até 2034. As emendas propostas espoletaram a controvérsia no país, gerando reacções díspares entre parlamentares, analistas e activistas.

http://www.al-monitor.com/pulse/originals/2019/02/egypt-constitution-changes-sisi-opposition-amendments.html#ixzz5es2XGMvh


MC

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